Tudo começou há algumas décadas em Santa Bárbara D’Oeste quando a Brenda nasceu. A Brenda é humana, não felina. Mas ela gosta dos bichos desde sempre, um vínculo forte mesmo, daqueles que comove, que fala no coração. Talvez tenha passado a infância capturando gatos e cachorros às escondidas, dormindo abraçada com eles, escondendo filhotes debaixo da cama. Tudo na sua imaginação, é claro.

Essa é a história da Brenda.

A menina teve hamsters, coitadinhos, de uma vida tão breve! Com a rapidez que chegam, eles se vão. E a Brenda, que se embala em enredos longos, queria mesmo era um animalzinho para cuidar por um tempo incontável, um tempo que se arrastasse e permanecesse. Só adulta é que teve cachorros e sua família se entregou nessa coisa de dividir espaço e afeto entre pessoa e bicho.

E a vida de Brenda foi mudando, os roteiros se transformando e entre os livros e as palavras, ela ia transitando com um pé no real e outro na fantasia. Aí que sua estrada cruzou com a do Erick, de Limeira, vai entender como essas coisas acontecem. Ele já morava em São Paulo, ela no interior. Namoraram na distância das cidades até que em 2019 ela se mudou para a capital.

Essa é uma história de um romance. 

Casaram-se no cartório da cidade de Brenda em março de 2020. Fim de verão, muito calor, só alegria, famílias unidas, laços selados e lua de mel à vista. Mas como se as chuvas de março anunciassem uma tempestade, uma semana depois, o Brasil foi lavado pela pandemia. Os planos se desfizeram, não haveria mais viagem e os abraços foram proibidos. 

Essa virou a história de um trem descarrilhado. 

Brenda e Erick ficaram no interior, ainda sem entender o que vinha adiante, sem saber que o tempo às vezes é muito longo. E travesso.

Foi numa manhã que escutaram miados vindos da rua e encontraram um gatinho minúsculo, sozinho, perdido. Até à noite, acharam outros dois, todos da mesma ninhada espalhados pela vizinhança e a fêmea-mãe rondava a rua, vigiando os filhotes ou quem sabe buscando um abrigo. A família de Brenda cuidou e alimentou e em um final de semana encontraram tutores para todos.

Os gatinhos felizes e a Brenda triste. É verdade que ela queria muito ter bichos em São Paulo, queria companhia, sentia falta disso. No seu sonho mais bonito ela fazia da sua casa lar temporário para animais resgatados, mas não podia tê-los no apartamento de São Paulo e o Erick também não parecia querer assumir esse compromisso. 

Essa, é a história de uma separação.

Os gatos se foram, mas semanas depois, numa noite de maio, o pai de Brenda entra em casa assustado e pergunta se a filha estava a fim de começar tudo de novo. Sem entender, ela o seguiu e mais uma vez saíram pela rua seguindo o barulho de felino filhote e chegaram na garagem do vizinho, e depois no carro do vizinho e então no capô do carro.  Tinha alguém ali e carregando lanterna e muita paciência, procuraram aquele pequeno que se escondia ardiloso e que fugiu, mas foi pego pelo Erick, agora arranhado e seduzido pelo gato preto como um breu.

Essa é a história de um encontro.

Em casa, Brenda deu banho, comida, água e já tinha desistido de qualquer possibilidade de ficar com ele, sabia que não poderia e já buscava alguém que pudesse adotá-lo. Ela estava comendo quando o Erick, com olhos apaixonados, dessa vez não só por ela, mas também pelo bichano, entrou no cômodo contando do gato que rolava, se esfregava, ronronava. Ela riu por fora e um tanto triste por dentro, desconfio até que tentou não dar importância para aquela vibração repentina de Erick.

Mas ele estava diferente. Brenda percebeu na voz do marido impressionado com o jeitinho do gato que ele tramava alguma coisa. Dava desculpas, talvez eles devessem se mudar do apartamento, talvez não fosse tão ruim assim, talvez precisassem de um lugar maior, o bicho tinha gostado dele, não é? 

Essa, é a história de uma adoção. Não sei se do gato pelo casal ou o contrário. 

O filhote ficou com eles e recebeu o nome de Nero, que carrega dois significados, o Imperador Romano e a cor negra, em italiano.

Quase quatro meses depois do início da pandemia, Brenda e Erick botaram as malas nas costas e voltaram para São Paulo, corroídos de saudades de casa e com um novo parceiro. A família dela, em Santa Bárbara, mandou notícias de que acharam o quinto dos filhotes e a mãezinha deles, tão persistente quanto esses humanos em encontrar os bichinhos.

Os olhos de Brenda brilham quando ela fala do Nero, que chegou para fazer o último ano possível e vivo. Ela e Erick aprenderam juntos a cuidar dele e um do outro, porque para viver junto é preciso partilha, paciência, encontro e disposição. Eles estavam dispostos, os três.

E tudo isso, só pode ser história de amor.

Esse é o Nero!

Essa é uma produção Fio, um projeto de escrita literária criada a partir de relatos pessoais, compartilhadas comigo em encontros virtuais.
Você me conta sua história, eu a escrevo.

Brenda foi uma das primeiras participantes do Fio e escolheu essa história especial para eternizar num pequeno livro criado e produzido por mim.

Acesse o perfil da Brenda para ver seu post sobre o Fio e conhecer também seu trabalho sobre livros, traduções e literatura.

2 comentários On Fio | História de gatos e outros amores

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